René Bértholo nasceu em 1935, na localidade de Alhandra, filho de Augusto Bértholo.[2][3]
Frequentou a Escola de Artes Decorativas António Arroio entre 1947 e 1951.[4] Depois de concluir os estudos liceais em 1951, integrou-se na Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, onde esteve eaté 1957.[3] fez parte do grupo de alunos do estudo aquilosado e conservador daquele estabelecimento.[2] Entre 1953 e 1955, foi um dos fundadores e directores da revista Ver, em conjunto com os seus colegas da escola.[4][2] Começou a expor ainda como aluno da Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, tendo em 1953 feito parte da VII Exposição Geral de Artes Plásticas, a convite de Júlio Pomar, e em 1954 entrou no I Salão de Arte Abstracta.[4][2] Em 1956 organizou um atelier por cima do Café Gelo, no Rossio, com José Escada, Gonçalo Duarte e João Rodrigues Vieira.[3] René Bértholo também fazia parte de um grupo informal que se reunia no café, onde convivia com vários artistas, como Mário Cesariny, Luiz Pacheco, Herberto Hélder e Mário-Henrique Leiria.[3] Entre 1955 e 1957 esteve na Galeria Pórtico com José Escada, Costa Pinheiro, Teresa Sousa e Lourdes Castro, tendo feito a sua primeira exposição individual naquele espaço em 1956.[3] Aí e noutras exposições da época se afirmou uma nova geração de artistas que maioritariamente optaria pelo exílio, mas o impacto público das suas exposições ficou então assinalado pela reportagem de capa do «Século Ilustrado» (6 Abril 1957) intitulada «Os jovens pintores sem bênção».[carece de fontes?]
Carreira artistica
Em outubro de 1956 casou com Lourdes Castro, e nesse ano viajou até Munique, na Alemanha, onde esteve cerca de um ano, tendo feito exposições com Lourdes Castro, Costa Pinheiro e Gonçalo Duarte.[2] Regressou a Portugal durante algum tempo, e depois fixou-se em Paris, no Inverno de 1958.[2] Naquela cidade criou um dispositivo de serigrafia, que permite a edição da revista KWY, fundada por si e por Lourdes Castro, relacionada com o grupo do mesmo nome, formado pelo casal e pelos artistas Costa Pinheiro, Gonçalo Duarte, José Escada, João Vieira, Jan Voss e Christo.[3] Como parte do grupo, fez exposições nas cidades de Saarbrücken, Lisboa, Paris e Bolonha.[3] Em Paris tornou-se bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian entre 1959 e 1960.[3] Em 1961, fez os seus primeiros desenhos e monotipias de espalhamento e acumulação de imagens.[4] Em 1963 fez a sua primeira exposição individual no estrangeiro, na Galeria Dragon, em Paris, tendo participado, ao longo da década de 1960, em várias exposições colectivas no âmbito do movimento da Nouvelle Figuration.[3] Uma destas exposições foi a Mythologies Quotidiennes, realizada em 19564 no Museu de Arte Moderna de Paris.[4] A partir de 1966, começou a construir vários objectos com movimento, chamados de modelos reduzidos.[4] Fez parte de uma exposição no Museu de Arte Moderna de Paris, e foi responsável por uma grande pintura mural em Halles, a convite do Centro de Arte Contemporânea.[2] Também fez várias esculturas para espaços urbanos, utilizando betão armado a cores e cerâmica.[2] Pouco tempo depois, René Bértholo e Lourdes Castro separaram-se.[2] Entre 1972 e 1973, esteve em Berlim para estudar a electrónica aplicada à arte, a convite da Deutscher Akademischer Austauschdienst.[4] Construiu a Deskoncertos de Mozika,[2] uma máquina de sons criada a partir dos projetos dos programadores eletrónicos aleatórios usados nas suas esculturas móveis, embora só tenha sido apresentada ao público em 1995.[carece de fontes?]
Na sequência da Revolução de 25 de Abril de 1974, que restaurou a democracia,[2] René Bértholo voltou a Portugal em 1981, tendo-se estabelecido na região do Algarve.[4] Além de trabalhar em pintura, também criava objectos animados, destacando-se a sua máquina de música.[2] Em 1983, criou uma obra de arte para o Hospital do Barreiro.[carece de fontes?]
Em 2000, foi organizada uma exposição retrospectiva da obra de René Bértholo, que teve um grande impacto.[2] Nesse ano uma das suas monotipias foi apresentada na exposição retrospectiva Making Choices do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque.[4] Também expôs por várias vezes em Lisboa, incluindo na Galeria Mundial Confiança, no Chiado, e a exposição Pássaro em Terra na Galeria Ratton.[2] Em 2001, fez a exposição Confusões na Galeria Trem, na cidade de Faro, e quando faleceu estava a expor no Palácio da Galeria, em Tavira, com o título O Sol e a Lua.[2] Nos seus últimos doze anos foi representado pela Galeria Fernando Santos, na cidade do Porto.[4]
Lança em 2001 o seu único disco, Um Argentino no Deserto,[5] editado pela Sirr Records, um conjunto de 18 composições minimais e aleatórias, a remontar à música concreta. Em 2017, o álbum é reeditado em vinil pelo selo da editora Grama.
Falecimento
René Bertholo faleceu em 10 de Junho de 2005, vítima de doença prolongada.[4]
Homenagens
Em sua homenagem, a freguesia de Alhandra e o concelho de Vila Franca de Xira criaram a Galeria de Arte Augusto Bértholo.[2] Foi considerado pela Galeria Fernando Santos como uma das principais figuras na pintura contemporânea nacional.[4]
Obra
"A pintura de René Bertholo começa por equacionar de um modo muito pessoal a relação entre figuração e abstração" [6] e articula-se com os universos da arte pop e do Nouveau réalisme francês. Utilizando técnicas diversificadas, "os seus trabalhos são o registo de pequenos momentos do quotidiano, dos gestos, gostos, tiques, anedotas, sonhos e objetos da vida moderna das cidades" [7].
O período inicial, habitualmente identificado com a figuração narrativa, "durou apenas cerca de quatro anos, de 62/3 a 66" [8]; trata-se de um momento decisivo, em que fixa os princípios geradores da obra futura. Em obras como, por exemplo, Carta do Líbano, 1966, Bertholo recorre a sistemas compositivos que viriam a ser recorrentes (acumulação de formas, fragmentação da imagem, etc.) e a um universo de motivos que antecipa, de igual modo, muito do que estava para vir.
A multiplicidade de dispositivos e referências é determinante na configuração das pinturas desta fase, onde vemos confluir "a expressão figurativa, processos do automatismo psíquico de raiz surrealista, a abstração e uma vaga atitude pop. O quadro dentro do quadro, a lógica da banda desenhada, a composição padronizada, sem um centro, os motivos da vida quotidiana sob transformação poética e onírica, a seriação com pequenas variações, o recurso a vários suportes […]" [9].
A partir de 1966 efetua um desvio que o leva a interromper a pintura sobre tela. Constrói os primeiros objetos com movimento, que denomina "modelos reduzidos" e onde, nas suas próprias palavras, procura "ilustrar um só tema, as manifestações de um elemento natural. [...] As imagens dos meus objetos são sempre muito esquemáticas. Quero que toda a gente as reconheça"; e prossegue mais à frente: "Uma outra característica destes autómatos é a importância visual da parte mecânica (engrenagens de precisão, cremalheiras, calhas, interruptores, motores, programador, etc...). [...] O objeto é constituído não só por ele próprio mas também pelos seus maquinismos, o programador aleatório, o seu cordão umbilical e todos os fios de cor" [10].
A dimensão lúdica de objetos como Palmier (Palmeira), 1966, e Arc-en-Ciel (Arco-iris), 1969-71, interpela o conceito de paisagem, com a colocação em movimento de um ou mais elementos, "numa espécie de animação e objetualização do desenho" [9].
Motivado por estudos realizados de eletrónica aplicada à arte feitos em Berlim no início dos anos de 1970, Bèrtholo realiza uma série de "máquinas de sons" onde aprofunda algumas das questões anteriormente afloradas e que apresentará apenas a partir de 1995 com os deskoncertos de Mozika. Trata-se de uma "gigantesca e sempre crescente acumulação de módulos que gravam e transformam sons da vida quotidiana" [11].
A partir de 1974 retoma a pintura, substituindo a acumulação inicial por grupos de imagens; cada pintura integra agora uma narrativa em dois ou mais episódios separados (veja-se, por exemplo, Memórias dum circo, 1991). E surgem os quartos cheios de coisas, um espaço imaginário povoado por "personagens de ficções tradicionais, formas embrionárias entre o vegetal e o animal, puzzles e inventários de objetos diversos do quotidiano banal, um delírio imagético e entrópico, em que evita uma visão unitária" [12]. "Lúdica, onírica e dinâmica a obra de Bèrtholo não é feliz, sonhadora ou rápida. Os seus jogos são perigosos, os seus sonhos são pesadelos, a sua velocidade é abismal. Luzes espectrais, noturnos pesados, pontos de vista vertiginosos […] objetos de cenografia inquietantes, personagens humanas ou os seus duplos animais […] e extraterrestres são os elementos das suas histórias pintadas" [7].
"O processo de reutilização ou remontagem de figuras e objetos anteriormente apresentados far-se-á nos últimos anos recorrendo ainda à computação gráfica que facilita o recurso estilístico do autor, confirmando uma imagética predileta da qual nunca estiveram ausentes algumas referências autobiográficas" [13].
↑Fernandes, João — O Mundo de René Bertholo. In: Bertholo, René — René Bertholo. Porto: Museu de Serralves, 2000.
↑ abPinharanda, João — Pinturas com luz: alguns pintores portugueses contemporâneos. Lisboa: EDP — Eletricidade de Portugal, 1997.
↑Pomar, Alexandre — Figura. Ficção. In: Bertholo, René — René Bertholo. Porto: Museu de Serralves, 2000. ISBN 972-739-073-0
↑ abNazaré, Leonor — René Bertholo. In: A.A.V.V. — Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão: roteiro da coleção. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, p. 110. ISBN 972-635-155-3
↑René Bertholo, conversa com Jean-Luc-Verley. In: Bertholo, René — Modèles Reduits. Lisboa: Galeria 111, 1972.
↑ Nazaré, Leonor — René Bertholo. In: A.A.V.V. — Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão: roteiro da coleção. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, p. 110.
↑Nazaré, Leonor — René Bertholo. In: A.A.V.V. — Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão: roteiro da coleção. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, p. 110.
↑Melo, Alexandre — Arte e Artistas em Portugal. Lisboa: Instituto Camões, 2007, p. 150. ISBN 978-972-25-1601-3.
Bibliografia
SERRA, Filomena (2006), René Bertholo, Pintura, objectos e mozikas. Lisboa, Editorial Caminho. Colecção Caminhos da arte portuguesa no século XX. ISBN 972-21-1726-2
MARREIROS, Glória Maria (2015). Algarvios pelo coração, algarvios por nascimento. Lisboa: Edições Colibri. 432 páginas. ISBN978-989-689-519-8