A zarabatana (originária da palavra árabezarabatan) é uma arma que consiste num tubo originalmente de madeira (caule oco), e hoje de metal ou plástico, pelo qual são soprados pequenos dardos, setas ou projécteis. A zarabatana é uma arma, não um brinquedo, podendo infligir danos graves. Existem restrições a sua venda no Reino Unido, no Canadá e em alguns estados americanos.
Atualmente o tiro de competição com zarabatana é praticado em todo o mundo, em especial nos Estados Unidos da América. Em Portugal é uma prática um pouco desconhecida, mas que começa a ganhar algum relevo, visto ser uma actividade muito divertida, acessível, económica e centrada para todas as idades. Facilmente se pode adquirir uma zarabatana no mercado português ou brasileiro, estando à venda em lojas especializadas em material de desportos de precisão.
As zarabatanas eram utilizados pelos povos indígenas da América do Sul (Amazónia e Guianas) e Sudeste da Ásia, e por algumas tribos da América do Norte, que as utilizavam para caçar pequenos animais, nomeadamente pássaros, esquilos, macacos e coelhos. As setas utilizadas (muito leves) possuíam em média de 10 a 15 cm, e tinham pontas embebidas em venenos ou substâncias tóxicas — curare, secreção de sapos e seivas venenosas. As seivas eram extraídas de plantas como a Antiares toxicaria e a Palicourea marcgravii, entre outras.
Acredita-se que a zarabatana foi utilizada inicialmente por pequenas comunidades de caçadores e colectores ainda na Pré-história.
O uso da zarabatana pelos nativos do Novo Mundo
Havia várias maneiras de fabricá-la e uma delas, adotada por tribos ao longo do Rio Içana entre Brasil, Venezuela e Colômbia, consistia no emprego de dois tubos, um de paxiúba e outro de uma gramínea. Após imersão em água para amolecer a polpa, esta era removida com o auxílio de varetas longas. Com a ajuda de fogo os tubos eram endireitados e seus interiores lixados com chumaço de raiz áspera colocada nas pontas das varetas. O tubo menor de gramínea era colocado dentro do de paxiúba. Em uma extremidade era fixado um bocal para facilitar o sopro e em algumas zarabatanas um dente de capivara era fixado com resina no terço inferior para servir de mira.[1]
Índios do Amazonas fabricavam a zarabatana utilizando o caule da palmeira paxiúba (Iriartea setigera Mart.), com três a cinco metros de comprimento e de quatro a cinco centímetros de diâmetro. O tronco era partido longitudinalmente, a medula era removida e as duas partes unidas novamente com o auxílio de fibras extraídas de cascas de árvores.[2] Índios peruanos usavam este mesmo processo na fabricação de zarabatana.[3] Algumas tribos faziam a zarabatana com dois canudos de madeira unidos um ao outro com fibras de jacitara ou palmeira-cipó e vedados externamente com cera de abelha. A parte com o bocal era mais larga, e a arma afinava em direção à outra extremidade.[4]
A flecha da zarabatana, de trinta a quarenta centímetros de comprimento, era feita de cerne de algumas palmeiras. A ponta era afinada e na base ia um chumaço de paina ou algodão, que se ajustava ao diâmetro interno da zarabatana. Ideal para abater aves e animais no topo das árvores e seu alcance com precisão era de vinte a vinte e cinco metros,[1] embora um índio bem treinado e com equipamento de boa qualidade conseguia precisão em até cinqüenta ou sessenta metros.[5] Índios do Amazonas usavam a paina do fruto da sumaúma ao invés do algodão nas flechas. Estas eram feitas de pecíolo da folha da palmeira paxiúba.[2]
O curare, veneno utilizado em flechas, imobilizava imediatamente o animal, uma vez que a reação ocorria nos músculos do pescoço, a seguir nos da nuca e depois nos dos membros. Posteriormente atingia o diafragma e os músculos cardíacos e a morte era por asfixia. A carne do animal morto podia ser ingerida sem problemas, uma vez que o veneno não fazia nenhum efeito no sistema digestivo.[6]
Os Astecas do México pré-colombiano, em vez de utilizarem flechas na zarabatana para caçar pássaros, atiravam pequenas bolas de barro cozido.[7]
Os Cherokee utilizavam para caçar e mesmo na guerra um tipo de zarabatana feita de taquara, medindo de dois a três metros de comprimento. Os diafragmas, que são as partes dos nós que obstruem as extremidades dos gomos, eram removidos com o emprego de brasas. As setas eram feitas de acácia-da-terra (Robinia pseudoacacia) e tinham trinta centímetros de comprimento. As plumas eram de penas de pássaro ou pelos de animais.[8]
Variação
Um objeto de funcionamento similar, e que também pode infligir alguns danos, costuma ser improvisado no Brasil com o caule oco de folhas de mamoeiro (Carica papaya), por onde são sopradas as sementes relativamente pesadas da cana-da-índia (Canna indica).
Referências
↑ abGALVÃO, Eduardo (1921-1976). Encontro de sociedades: Índios e brancos do Brasil. Prefácio de Darci Ribeiro. Rio de Janeiro, Paz e Terra. 1979, 300 p.
↑ ab PEREIRA, Manuel Nunes (1892-1985). Moronguêtá: um Decameron indígena. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira. 1980,2ª Ed.; vol. 1. P. 1-434
↑MCQUIRE, J. D. A study of the primitive methods of drilling. 136. Honolulu, Havai; University Press of the Pacific. ( From the report f the U. S. National Museum for 1894, pages 623-756, with figures 1-201). 2002, 136 p.
↑BATES, Henry Walter (1825-1892). Um naturalista no rio Amazonas. Belo Horizonte, Edit. Itatiaia; São Paulo, Edit. da Universidade de São Paulo. 1979, 300 p.
↑ abCAVALCANTE, Messias S. Comidas dos Nativos do Novo Mundo. Barueri, SP. Sá Editora. 2014, 403p.ISBN 9788582020364
↑REVISTA DE ATUALIDADE INDÍGENA. Curare – O silencioso veneno da Amazônia. p. 57-63. In: Revista de Atualidade Indígena. Brasília, Fundação Nacional do Índio. 1977, ano I, nº 6, 64p
↑SOUSTELLE, Jacques (1912-1990). La vida cotidiana de los aztecas em vésperas de la conquista. Octava reimpresión. ISBN 968-16-0636-1. Mexico, Fondo de Cultura Economica. 1991, 283 p.